sexta-feira, outubro 29, 2004

 

Coração ególatra

Não é difícil saber o porquê de Alan Parker possuir tantos detratores: ele, geralmente, é a pessoa que mais supervaloriza seu trabalho. Gosta de exagerar no mau caratismo e no mau gosto em suas películas, além de exercitar um cabotinismo totalmente desnecessário. Mas sabe captar boas imagens, e, quando não está embebido pelo próprio ego e convencido da própria genialidade, sabe amarrar com competência suas tramas. "Coração Satânico" talvez seja seu filme mais efetivo, um autêntico labirinto cinematográfico com pretensões a noir, editado de forma veloz e propositalmente confusa, que conta a história de um detetive contratado para procurar um jazzista desaparecido. A impressão mais forte é que, desde o início, Parker estava obcecado em mostrar ao espectador o quão fantástico era o final de sua história, mas, no fim das contas, não é difícil entrar no jogo sombrio proposto pelo cineasta.

O mais assombroso na história do zagueiro Serginho é poder ter visto os últimos momentos de sua vida. Chega a dar calafrios a imagem dele levantando os braços antes de desabar no gramado. Segundos estes eternizados pelo videotape, e transformados em intermináveis pela televisão. Triste.

quinta-feira, outubro 28, 2004

 

Ele morreu

A morte do zagueiro Serginho no gramado do Morumbi ontem à noite foi realmente assustadora. Mas de repente virou um prato cheio para transmissões televisivas sensacionalistas e demagogas. Dureza foi agüentar dois dos mais medíocres repórteres esportivos que já vi, Antonio Petri da Band e Lívio Lamarca da Record, querendo, a todo custo, encontrar os culpados pelo falecimento do jogador, se colocando na posição de donos da verdade incompatível com a profissão que escolheram. Vale tudo no show de horrores em busca da audiência.

Mostra Zé do Caixão, em SBC:
"À Meia-Noite Levarei Sua Alma"****
Impressionante e seminal obra-prima do terror, filme feito com pouquíssimos recursos mas com muita criatividade e entusiasmo, e que consegue criar um clima de tensão quase palpável. A cena final é antológica e atesta toda a genialidade de José Mojica Marins, não à toa reconhecida mundo afora.
"Esta Noite Encarnarei no seu Cadáver"***
Filme mais ambicioso e caprichado que seu predecessor, aposta no trash puro e simples para passar seu recado, com personagens secundários melhor desenvolvidos e efeitos especiais mais apurados. Mas é longo e irregular, e, mesmo contando com o toque de mestre do cineasta em boa parte de suas cenas, perde feio para "À Meia-Noite...".

Para terminar: gosto da banda, mas chamar Dead Fish de hardcore é sacanagem.

quarta-feira, outubro 27, 2004

 

Exodus ao vivo: picaretagem

Pena que determinadas coisas não saem como a gente imagina... o show do Exodus na última sexta-feira foi um grande exemplo. Primeiro, o número de bandas de abertura foi, novamente, excessivo. Segundo, os mesmos pouco fizeram para empolgar o público (à excessão do Vulcano e do Atomica), sendo que o set do Korzus foi particularmente horroroso. E, terceiro, a atração principal deixou a desejar, pois trouxe ao Brasil o ex-vocalista do Skinlab, e ele deu um baita vexame. O cara não sabia cantar NENHUMA música, e ainda tinha uma postura no palco que beirava o ridículo. E os caras da banda estavam pouco se lixando! Total falta de respeito.

Muito mal se falou do último projeto dos irmão Coen, "Matadores de Velhinhas". Mas o filme cumpre seu papel com louvor, mesmo sendo uma obra claramente menor na filmografia dos dois. Os diálogos são afiadíssimos, os personagens caricatos bem ao gosto dos diretores/roteiristas e as interpretações, excepcionais (óbvio destaque para Tom Hanks e Irma P. Hall, mas também para o improvável Marlon Wayans). Mesmo com algumas quedas em seu ritmo, a película lembra as comédias mais despretensiosas de Woody Allen, e aponta para novos rumos, mais escrachados, na carreira desses talentosos brothers. Esperemos apenas que a fórmula de sucesso de seus filmes não esteja se esgotando...

terça-feira, outubro 19, 2004

 

Perversão e pureza

Uma das grandes sacadas de “Amarelo Manga” é o extraordinário poder de comunicação de suas imagens: o filme não necessitava nem mesmo de diálogos para se fazer entender, tamanha a força e a secura de suas cenas. Mas as ardentes histórias paralelas orquestradas pelo estreante Cláudio Assis carecem de um maior pique, de um mergulho mais profundo em uma sugerida claustrofobia de personagens enclausurados em si mesmos (seja pela opção sexual, por uma doença respiratória, pela idade ou pela solidão), de uma maior contundência e brilho em seu desenvolvimento. As idéias são ótimas, porém a execução como um todo deixa a desejar. Mas não deixa de ser salutar o aparecimento de um cineasta disposto a polemizar e a tratar de temas de difícil digestão fazendo cinema para o grande público, mesmo que ainda encontremos um indisfarçável ranço de pretensão em seu primeiro filme. Provavelmente, ele ainda pode dar muito o que falar – basta apenas sua arte ser tão incandescente quanto sua alma.

sexta-feira, outubro 15, 2004

 

Filmes e preguiça

Vi vários filmes essas últimas semanas, mas a preguiça falou mais alto e não postei nada por aqui. Uma passadinha rápida em alguns deles...

"Alguém Tem que Ceder" ***
Um conto de fadas para a terceira idade. Tem na simpatia e nas atuações de Jack Nicholson e Diane Keaton seus pontos mais fortes, mas é artificial e esquecível.
"Rei Arthur" **
Esperava um filme bem pior, admito... ganhou alguns pontos pela despretensão. Mas o nefasto dedo da linha de produção Jerry Bruckenheimer é facilmente perceptível na plastificada direção de Antoine Fucqua e no constrangedor final. Mediano mesmo como filme de ação.
"A Morte Não Manda Recado" ***
Nada precisa ser dito a respeito de Sam Peckimpah. Seu apuro visual e fluidez são de impressionar qualquer um. Mas, apesar algumas de seqüências antológicas, esse filme tem muita encheção de lingüiça em seu miolo, principalmente as do romance entre Cable Hogue e a prostituta Hildy. Mas valeu a visita, sem dúvida.
"Febre da Selva" ***
Spike Lee carrega na verborragia porque parece ter muita coisa a dizer. E gosta de fragmentar suas narrativas, tratando com vários personagens ao mesmo tempo. Vez ou outra, é risívelmente simplório em seus argumentos, mas os defende com unhas e dentes. E complementa a tudo isso com um visual tipicamente pop. Não faz filmes bem resolvidos, mas eles são atraentes como poucos.


sexta-feira, outubro 01, 2004

 

Rock da terceira idade

Ouvir os discos clássicos dos Titãs não traz somente saudades de sua sonoridade agressiva e única no rock comercial brasileiro, abandonada recentemente pela banda em detrimento de um som fácil, cafona e próximo ao indecente, uma emulação pobre de Jovem Guarda e dos acintes sertanejos. Ouvir aqueles velhos LPs nos mostram também a diferente postura dos Titãs de agora dos Titãs da época, que se notabilizaram por letras e postura afrontadoras; e hoje em dia preocupados com as dores do casamento, das relações monogâmicas e da rotina na crise da meia-idade. Ou seja, uma decadência não só musical, mas também estética e lírica. Caras que um dia foram totalmente iconoclastas, rendidos ao sistema que tanto criticaram. Ao que parece, a ordem natural das coisas... infelizmente.

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